sábado, 3 de outubro de 2009

Crônica #17: His Son

França. O nosso novo destino apenas nos mostrava a extensão dos tentáculos da sociedade fundada por Christian, a Rosenkreuz. E esse não era exatamente um passeio turístico.
Fechamos a nossa conta no hotel assim que voltamos da biblioteca, e tomamos o primeiro trem até Paris. De lá, pegamos um táxi de viagem até a cidade que vimos nos registros, no sudoeste da França, a região que chamam de Gasconha. Nosso destino, a pequena cidade de Sarlat-La-Canéda. A viagem foi rápida, e logo nos estabelecemos em outro hotel, saindo assim que organizamos as bagagens, ávidos por novas pistas.

- Acho que aqui eu posso guiá-los – falava Mikhail, enquanto andávamos – Eu passei algum tempo em Paris, estudando, e vim algumas vezes aqui, por recomendação de meus avós. Conheço a maioria das ruas.
- Então... Aonde vamos? – perguntei, olhando ao redor, curiosa.
- Vamos à prefeitura, saber se guardam registros de viajantes ou os nomes das famílias mais tradicionais da época. Devemos achar alguma coisa.

Seguíamos entusiasmados, enquanto conversávamos em voz baixa sobre o rumo que nossa busca estava tomando. Durante a viagem no trem até Paris, havíamos levantado a hipótese de que o filho de Christian e sua esposa Laura devia ter sido mandado para a cidade acompanhado. Provavelmente por algum conhecido que soubesse exatamente para onde estava indo. Com um pouco de sorte, poderíamos descobrir o paradeiro dessas pessoas.
Não pude deixar de reparar como era uma cidade linda. Havia inúmeras construções com fachadas em estilo renascentista, e muitas pessoas andavam pelas ruas, ou conversavam nos cafés. Roberto comentou que a cidade havia sido declarada patrimônio mundial, por ter sido conservada por tanto tempo do mesmo modo como fora construída. Desde então, serviços de restauração são feitos, com a preocupação de manter as antigas construções.
A prefeitura ficava num prédio no mesmo estilo antigo. Lá dentro, fomos recebidos diretamente pelo prefeito, um senhor magro de meia idade, mas muito animado.

- Ah, jovens turistas! – exclamou, apertando as mãos de Mikhail e Roberto, e beijando a minha gentilmente – Sejam bem-vindos! E então, estão gostando da estadia?Esta é mesmo uma bela cidade. É pacífica, mas bastante interessante, para quem gosta de história. Esta é, aliás, a razão pela qual recebemos a atenção dos turistas. História! Mas ah, como é trabalhoso preservar os edifícios... Ainda mais quando jogam lixo por aí... Alguém precisa educar esses turistas.
- Ahn... Senhor prefeito? – Roberto o chamava, sem querer arrancá-lo de seu devaneio de forma grosseira.
- Sim? Oh, tinham algo a perguntar. Pois bem, perguntem!
- Nós viemos aqui exatamente atrás da história em si. Eu sou historiador, e estamos pesquisando sobre as tradições locais e as famílias mais antigas da França. Sabe se podemos encontrar alguns documentos antigos? De três ou quatro séculos atrás?

O prefeito pensou um pouco, sentando na cadeira de seu gabinete. Logo depois, sorriu para nós.

- Claro! Que ou me lembre, temos alguns arquivos organizados por historiadores locais, em um centro de pesquisas anexo ao governo. Neles, acho que podem encontrar aquilo que procuram.

Ele nos entregou um papel, onde escreveu o endereço do lugar para onde íamos.

- Podem ir. Está aberto a essa hora, mas deve fechar em breve. Não fica ,muito longe, mas é bom correr. Boa sorte!

Com isso, nos despedimos do prefeito, e rumamos para o centro de pesquisas, a duas quadras dali. Era um prédio pequeno, com portas de vidro, e ainda estava aberto, apesar de não haver muito movimento lá dentro. Falamos com a moça da recepção, que nos encaminhou para uma sala especial, que guardava os arquivos mais antigos da cidade. Fomos obrigados a usar luvas e legar pinças para poder tocar os documentos, por sua idade e fragilidade.
Uma vez devidamente equipados, entramos, e começamos a procurar os arquivos da época da Rosenkreuz. Não demorou tanto para acharmos o que procurávamos, em uma pequena pasta entre tantas outras, pega por meu noivo. Ele nos chamou, assim que encontrou os papéis certos.

- Sophy, Andolini... Achei.

Fomos rapidamente para a mesa onde Mikhail estava sentado, olhando o que ele encontrara.
Um pedaço de papel amarelado, com uma caligrafia caprichada em tinta preta, apontando nomes de pessoas, datas, e lugares. Era uma folha de um diário de bordo. A essa altura, eu já estava me acostumando às “premonições” de Mikhail. Provavelmente, já tinha uma idéia do que procurar. Ele apontou uma seqüência de nomes de três pessoas: um casal, e uma criança. O garoto David Kreuz. Com ele, dizia o papel, estavam seus responsáveis, o senhor e a senhora Brunetière. Andolini ficou lívido.

- Os Brunetière...
- Você sabe quem são? – perguntei, passando os olhos pelas informações na lista.
- Claro... Vi esse nome nos livros que peguei no subterrâneo, em algumas páginas. Inicialmente, achei que fossem pessoas importantes na Sociedade, mas, mais que isso... Além de grandes cientistas, eles eram amigos íntimos de Christian.
- Logo, também de Laura... – completei a sentença, pensando como de repente tudo fazia mais sentido – Laura Kreuz pediu a seus amigos, o casal Brunetière, para irem para a França com seu filho, antes de morrer. Não... Ela deve ter pedido para eles fugirem, caso acontecesse algo com ela. E, assim que souberam da morte de Laura, eles escaparam. Christian estava ocupado... Só reparou no sumiço dos Brunetière, com seu filho, muito depois de eles irem embora da Itália.

Mikhail olhava sério o papel. Ele terminou a cadeia de raciocínio, enquanto copiava, em uma folha a parte, a informação que seria necessária para nós.

- E então, Christian organizou sua situação em Veneza, após a morte da esposa, o mais rápido que pôde. Deu fim a tudo que poderia ligá-lo ao resto do mundo. O próximo passo, então, seria ir atrás de seu filho. Provavelmente, para extinguir do mundo o único remanescente de sua existência. Ele queria se isolar. Mas eu não acho que tenha sido apenas por causa da morte da esposa...

Ele se levantou, organizando os papéis novamente na pasta, e guardando sua cópia escrita no bolso. Olhou para mim e Roberto, com um brilho intenso nos olhos.

- Eles não estavam mais aqui quando Christian chegou. Pegaram um navio. Atravessaram o Mediterrâneo, em direção ao Mar Negro, e passaram pelo Bósforo. O destino era o antigo Reino da Polônia, ou, como chamamos hoje... Ucrânia.

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